Neste sábado, 28 de janeiro, é celebrado o Dia de Combate ao Trabalho Escravo. Segundo o Ministério Público do Trabalho (MPT-PI), somente no ano de 2022, foram 180 trabalhadores resgatados em situação análoga à escravidão no Piauí. De acordo com o MPT, esse é o maior número de trabalhadores resgatados dos últimos dez anos. Esse também é o segundo maior índice de resgatados no Estado desde que as operações iniciaram, ficando atrás apenas do ano de 2007, quando foram resgatados 195 trabalhadores. O número também é o terceiro maior em todo o país e o maior do Nordeste em 2022.
Foto: Divulgação/MPT
Para chamar a atenção da sociedade para a repressão à precarização do trabalho e exigir a implantação de políticas públicas de modo a prevenir que mais pessoas sejam submetidas ao trabalho análogo à escravidão no Brasil, membros do MPT, do Ministério do Trabalho e do Fórum Estadual de Combate ao Trabalho Escravo fizeram um ato, nesta sexta-feira (27), no cruzamento das avenidas Miguel Rosa e Frei Serafim.
Foto: Assis Fernandes/O Dia
Para o procurador-chefe do MPT-PI, Edno Moura, a quantidade de trabalhadores resgatados mostra que muito ainda precisa ser feito para erradicar o trabalho escravo no Piauí, mas também revela o resultado dos esforços dos órgãos de repressão em coibir esse tipo de atividade no estado.
“Nós temos uma atuação muito forte, no quesito repressão, mas isso, por si só, não é suficiente. Precisamos de políticas públicas de atendimento a essas vítimas, e precisamos de políticas públicas de prevenção. Então, por isso é importante esse dia, para que nós possamos convocar a sociedade para que ela tome conhecimento da existência do trabalho escravo, já que há uma negação muito grande de parte significativa da sociedade. A partir disso podemos exigir das autoridades, tanto do Ministério Público, quanto do poder legislativo e executivo, medidas para que nós possamos neutralizar o trabalho escravo no país”, afirmou.
Foto: Assis Fernandes/O Dia
De acordo com o procurador-chefe do MPT, o Piauí era conhecido, historicamente, por ser um estado exportador de mão de obra para o trabalho escravo em outros estados, mas é importante ressaltar que muitos trabalhadores também são submetidos à escravidão dentro do estado.
“O Piauí é o terceiro estado que mais resgatou dentro do próprio estado, ficamos atrás apenas de Minas Gerais e Goiás. Se nós somarmos os dois estados do Nordeste que ficaram em segundo lugar - Bahia, com 83, e Maranhão, com 81 -, a soma deles não alcança o que nós atingimos aqui no Piauí. Se somarmos ainda a região Norte, que é uma região em que tradicionalmente ocorre muito trabalho escravo, eles resgataram apenas 10 trabalhadores a mais do que todo o estado do Piauí, isso mostra a gravidade do trabalho escravo no estado”, destacou.
Ainda de acordo com procurador-chefe do MPT, no Piauí, quase todos os resgates ocorreram em uma das modalidades do trabalho escravo, que é a condição degradante de trabalho. O perfil desses trabalhadores é de quase na sua totalidade de homens, com idades entre 29 e 40 anos, com baixa capacitação e escolaridade.
“São pessoas que tem nível educacional baixo e as atividades costumam ser sazonais. Se você tiver em um local em que as condições de trabalho são: alojamento ao relento ou barraco de lona, sem instalação sanitária, em situação precária, sem água potável ou com água de cacimbões, é uma situação de degradação que pode configurar trabalho escravo”, alerta Edno Moura.
No Piauí, os resgates se concentram nos municípios do interior de Norte a Sul do estado. No extremo sul, os trabalhos se concentraram na produção de grãos e catação de raiz. Em todo o estado, o MPT também resgatou trabalhadores em situação análoga à escravidão na atividade de extração de pedra e, em menor número, na cadeia produtiva da carnaúba. Não houve nenhum registro de caso na Capital.
“Ano passado foi um ano político e muitos municípios tiveram aquelas obras de calçamento e pavimentação, e isso acabou dando um boom na atividade de extração de pedras, e nessa situação ocorreu muita situação degradante de trabalho. Em número bem menor, porque a gente já tem um combate forte, na cadeia produtiva da carnaúba”, afirmou.
Segundo a coordenadora da Comissão Pastoral da Terra, Joana Lúcia, uma das principais causas do trabalho escravo é a falta de políticas públicas voltadas para os trabalhadores em situação de vulnerabilidade. Por isso, Comissão Pastoral da Terra tem desenvolvido um trabalho voltado para formação, organização, denúncia do trabalho escravo e reivindicação dessas políticas públicas.
Foto: Assis Fernandes/O Dia
“Nós formamos grupos para trabalhamos a questão do conhecimento na área dos direitos, na formação e organização desses trabalhadores, e ao mesmo tempo, contribuímos para que esses trabalhadores conheçam seus direitos e reivindiquem políticas públicas. Esses trabalhadores e trabalhadoras só migram, saem dos seus municípios e se submetem à escravidão, porque falta políticas públicas, falta terra, falta trabalho, a maioria deles não concluiu o segundo grau. São trabalhadores altamente vulneráveis. A partir desse conhecimento, eles passam a entender o que é o trabalho escravo, e passam a reivindicar seus direitos”, explicou.
Nas operações, além de retirar o trabalhador da situação de violação dos direitos, o MPT e a Superintendência Regional do Trabalho têm atuado para garantir os pagamentos de verbas trabalhistas, as indenizações por danos morais individuais e coletivos e ainda a aplicação de multas aos empregadores, além de firmar termos de ajustes de conduta para evitar reincidências.
No entanto, segundo o procurador-chefe do MPT-PI, essas medidas não são suficientes para eliminar o trabalho escravo. “A repressão isolada, sem apoio de políticas públicas preventivas e de apoio aos trabalhadores após o resgate, não eliminará essa prática vil e criminosa de submeter cidadãos piauienses à escravidão”, lamenta, destacando ser fundamental as iniciativas junto ao poder público que garantam condições de enfrentamento do problema.